25 abril 2010

you could fall in

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Não é fácil gostar de Rohtko ou enxergá-lo como o grande artista plástico que é, mas esta definição - genial, na minha opinião - o aproxima muito do que a sua obra diz.


Smudgy squares from Diana Assennato Botello on Vimeo.


por ele mesmo:
"We flavor the simple expression of the complex thought. We are for the large shapes because it has the impact of unequivocal. We are for flat forms because they destroy illusion and reveal truth".

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da série: exercícios de escrita criativa - 8

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Premissas: utilizar um personagem criado por um dos colegas em sala para um texto livre, com a criação de um perfil determinado. Usar 10 sinônimos da palavra "ver".

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Sexo 2.0

(03:36:14) Gina entra na sala...
(03:36:15) Mauro entra na sala…
(03:36:15) Mauro fala para Gina: oi
(03:36:17) Ortopedista/28 entra na sala…
(03:39:19) Ortopedista/28 fala para Gina: olá, como vai? De onde tc?
(03:39:21) Só de toalha_44 fala para Gina: Oi, tem msn? Quer tc? Esse nome dá rima, hein?
(03:36:24) Gina fala para Ortopedista/28: Olá, eu tc de Pinheiros, e vc?
(03:39:25) Ortopedista/28 fala para Gina: Olha! Somos vizinhos, eu tc da Vila Madalena. Qtos anos vc tem?
(03:36:26) Gina fala para Ortopedista/28: Da vila? Coincidência, eu vivo lá. O Filial é a minha segunda casa além do meu consultório ser na Aspicuelta.
(03:36:32) Gina fala para Ortopedista/28: Tenho 29.
(03:39:34) Ortopedista/28 fala para Gina: Jura? Eu vivo no Filial. Já devo ter te percebido por lá. Você é médica também?
(03:36:43) Gina fala para Ortopedista/28: Sou psicóloga. Vamos para o msn? Me add: gina_1978@hotmail.com

Gina diz:
Oi

Marcão_ positive vibrations diz:
Hmmm… 32, safadinha...

Gina diz:
É. Tenho…

Marcão_ positive vibrations diz:
Eu curto mulheres mais velhas ;-) Psicóloga… de que tipo?

Gina diz:
Sou fenomenologista.

Marcão_ positive vibrations diz:
Oi?

Gina diz:
Ah, é difícil explicar, mas é uma corrente da psicologia fundada na idéia da intencionalidade da consciência levada à análise da estrutura essencial da ação, sabe? Tem uma pegada junguiana, mas com uns traços mais de psicanálise mesmo…

Marcão_ positive vibrations diz:
Sei. Tem divã?

Gina diz:
Tem, se quiser.

Marcão_ positive vibrations diz:
Hmmmm. Sexy. Como você é?

Gina diz:
Ah… normal. Não chamo muito a atenção. Tenho 1,63m, 58kg, cabelo escuro (não preto) na altura dos ombros e olhos castanhos.

Marcão_ positive vibrations diz:
Tem foto?

Gina diz:
Ahã.

A transferência de gina_1234.jpeg foi concluída com sucesso

Marcão_ positive vibrations diz:
Nossa… tá de parabéns! Sabe que você me lembra muito a minha mãe?!

Gina diz:
 … você disse “mãe”?

Marcão_positive vibrations diz:
Pô, é um puta elogio! A minha mãe é uma gata pra idade dela.

Gina diz:
Sei :-O

Marcão_ positive vibrations diz:
Não vem com Édipo-bullshit, não.

Gina diz:
Eu não disse nada.

Marcão_ positive vibrations diz:
Vocês psicanalistas são todos iguais. Aposto que vc tá me analisando desde que te chamei para tc.

Gina diz:
Eu ganho pra isso, gato. Não costumo trabalhar de graça para alguém que conheci num chat erótico.

Marcão_ positive vibrations diz:
Uuuh…. Afiadinha.

Gina diz:
Você nem imagina.

Marcão_ positive vibrations diz:
O que vc está usando?

Gina diz:
Lingerie preta e cinta-liga.

Marcão_ positive vibrations diz:
É sério?

Gina diz:
Claro que não.

Marcão_ positive vibrations diz:
Ahn?

Gina diz:
Você mora sozinho?

Marcão_ positive vibrations diz:
Moro.

Gina diz:
Eu estou usando um vestido estampado com flores de cerejeira. Um pouco acima do joelho.

Marcão_ positive vibrations diz:
É fácil de tirar?

Gina diz:
Só olhando.

Marcão_ positive vibrations diz:
Vc tem webcam? Queria tanto te observar...

Gina diz:
Tenho carro.

Marcão_ positive vibrations diz:
:-P****

Gina diz:
...?

Marcão_ positive vibrations diz:
Sério? Uau.... R. Girassol, 669. 5º. Andar. Vou deixar a porta aberta. Entra direto.

Gina diz:
vc tem álcool gel?

Marcão_ positive vibrations diz:
Não, mas tenho camisinha e KY. Serve?


73, 74, 75, 76, 77...

Toc toc.

78

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81

- Oi. Marcão?

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créditos: Foto Albano Afonso

05 abril 2010

da série: exercícios de escrita criativa - 5

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Premissas: 1 epifania, 1ª. pessoa do masculino, 20 palavras começadas com "v" e 10 com duas sílabas em "i"


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Ziiip.

A sexta-feira era de folga e eu sentia a casa só minha. Vagaroso e sonolento em pleno meio-dia, não soube dizer se o melhor era fazer faxina ou pagar contas atrasadas. Fitei o gato no sofá, vagabundeante sob a máquina de escrever como só ele consegue ser em manhãs muito quentes, e sem vacilo decidi que o melhor seria encarar o gaveteiro de Pandora. Três fundas gavetas negras de profundidade incalculável: um violento volume de vida de quase 10 anos de acúmulo caótico nunca organizado.

Escolher o gaveteiro dentre o iminente é o que eu chamo de procrastinação transferida. Quase nunca faço o que verdadeiramente preciso e sempre que possível, postergo o mais urgente. É o meu pequeno - e vergonhoso - protesto contra esta vidinha burguesa de vencimentos condominiais e endereços de assistências técnicas presos à post-its no espelho vaporoso do banheiro. Sinto-me alma livre que, ao invés de ticar, vaidoso e capricorniano, um dos itens da sua lista de afazeres semanais, opta por outra obrigação, das que nem temos coragem de anotar; a faxina de um decênio.

Sem uma gota de pressa, comecei pela última das gavetas. Sou dos que lêem revistas pelo final e eventualmente pulo para o fim dos livros antes do tempo. “Não acredito em finais felizes”, disse a mais de uma em tom voraz, mais ridículo do que convincente. Mas a escolha viria a calhar; entre Playboys voluptuosas e binóculos voyeristas, descansava em pó um estojo azul anil abarrotado de lápis de cor. Eram quase uma centena; velhos, carcomidos nas pontas, com colas de física em minúscula caligrafia. Em um canto, no fundo, o meu apontador em formado de globo terrestre. Há quantos anos eu não apontava um lápis? De pronto, de susto, um violento impulso pueril pôs em marcha um reflexo motriz desses que guardamos em músculos ainda infantis. Lixeira entre pernas, pus-me a apontar todas as tonalidades possíveis por minutos a fio numa repetição de movimentos que há muito meus dedos não viviam.

Vinte e três minutos e 78 cores depois, só o prazer de duas grandes e vistosas bolhas no polegar e dedo médio seriam provas vivas de minha paz de espírito. Que deleite! Que prazer! Com que rapidez perdemos as obrigações irrefutáveis da infância? Quando é que nos desapropriam da certeza do óbvio? Sob qual desculpa escolhemos afiar os comentários ao invés de pequenos pedaços de madeira? Com o vigor de uma mente em branco, lembrei de ser criança e rabisquei a conta de luz com feixes de todas as cores.  Fechei a gaveta, liguei o som e cantei muito, muito alto.

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créditos: Foto Olivia Bee

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